quinta-feira, dezembro 02, 2004

Desumanização

Na sociedade actual, verifica-se uma desumanização acentuada, onde os valores que congeminavam o Homem à sua essência humana, foram diminuídos em detrimento de este se ter tornado uma parcela de uma unidade produtiva. As pessoas são cada vez mais avaliadas pelo que fazem e produzem, e pouco pelo que são como pessoas, como seres humanos. O ênfase que se dá ao fazer, implementado pela sociedade capitalista, é um esvaziar de valores. Discute-se dinheiro, emprego, vencimentos. De causas e valores, ninguém debate ou discute. Longe vão os tempos em que as amizades consolidavam-se na realização de reuniões familiares, de tertúlias. Nestas debatiam-se causas, personalidades, obras fundamentais, ideais, convicções e em quase todas elas, a liberdade. Eram subversivas antes do 25 de abril. Agora, a organização da sociedade não promove a sua realização. Cultivamos a individualidade. A nossa sociedade está atolada de informação, de entretenimentos disponibilizados pela televisão – há quem diga que é o aparelho que nos embrutece – pela internet, pelas actividades plenas de sedentarismo que a sociedade inventou para alienar-nos do pensamento, da capacidade de pensar e desenvolver o sentido crítico. Navegamos imersos em informação que, sendo avulsa, acaba por nos sufocar. O emprego preenche-nos a quase totalidade do tempo, além daquele que a burocracia exige, atormentando-nos. (…)
(…)Curiosa também a ideia de que os pobres são mais unidos que os ricos. A pobreza promove a união, a amizade, o convívio. Os ricos sentem necessidade de erguer muros, barreiras. Individualizam-se. Mas a nossa sociedade actual privilegia o ter em detrimento do ser. Os jovens nascem nessa ânsia do ter, do consumir. Ambicionam desesperadamente o poder, como se ele fosse o ceptro que preenchesse a alma. Porém, a obsessão pelo poder provoca frustrações. Diria que esses ambiciosos alimentam a mesquinhez e nessa amálgama desenfreada, crescem e não evoluem. O conforto conquistado exerce o mesmo efeito que a riqueza. Corrói lentamente, vai consumindo, e quando despertamos para o essencial da Vida, o nosso interior vacila, já não somos barro, mas pedra crua, dura.


Duarte Olim