quarta-feira, outubro 08, 2008

Hora de Ponta



Bucareste é conhecida pela Paris do Leste. De facto, a maioria das tentativas de cópia, resultaram num desastre e ficaram aquém do original. Diria que o mesmo se passa com esta metrópole. A obstinação caprichosa de ditadores foi suficiente para lhe dar a fama, dotando a cidade de variadíssima toponímia que evoca a cidade luz, muita dela desprovida de qualquer sentido, mas a verdade é que o verdadeiro Arco do Triunfo, erigido em memória das conquistas napoleónicas, indaga qualquer curioso ciente deste facto, a que triunfos este arco romeno faz homenagem? A um triunfo boçal e fugaz de um tirano? Só se for. Bucareste sofre de sofreguidão pelo moderno. Cresce desmesuradamente, depressa, mas o crescimento é desarmonioso, nas ruas são visíveis sinais exteriores de riqueza do, passe o pleonasmo, novo-riquismo. Quanto a mim, não creio que seja novo, mas nas ruas reina uma indigência de pasmar e lamentar. A miséria não tem vergonha, coabita com o lixo, com o tráfego indecoroso, vagueia em todas as esquinas e tem como pano de fundo, um chorrilho de painéis publicitários que cobrem edifícios e impingem marcas, prometendo o paraíso aos fracos. Os casinos também abundam, adereçados de luzes pecaminosas. Sou forçado a compreender esta utilização abusiva da publicidade: a verdade é que os edifícios que não apresentam estas faixas esboroam-se e sucumbem à degradação. Reinam cores ocres e desbotadas que condizem com deterioração geral. Desta cidade, louve-se as faixas de bicicleta que, apesar de existirem em número suficiente, numa cidade plana e propensa para este meio, não foram acompanhadas pela adesão popular. É estranho, mas este romeno não tem comportamento de eslavo, apesar de fazer fronteira com países desta origem, parece latino, comportando-se como tal nos piores aspectos. Terá identidade? Em Bucareste, definitivamente não! Limita-se a copiar o padrão consumista das grandes metrópoles, vale a geração que viveu Ceausescu, essa sim, dotada de uma atitude muito própria, discreta, afável, mas patenteando alguma frieza que os povos do leste em geral documentam. Todavia, estes são mais espontâneos e efusivos, embora a pobreza e a miséria sulque nos semblantes, a expressão abatida e amargurada. Os campos elísios destas bandas têm um particular encanto e, no Outono, as matizes custodiam o tráfego feroz, e romantizam as bermas dos passeios sarapintadas pelo amarelo das folhas que capitulam. Esta é uma Roménia dos empurrões, em que não se é regrado para as filas, em que alguns valores foram esquecidos na ânsia destravada de atingir o modernismo. Procuro outra Roménia, pois esta vive em hora de ponta, está enferma e não dá tempo para desfrutar.

1 Comments:

At 3:30 da manhã, Blogger deep said...

Depois das tuas palavras - em que são evidentes a desilusão e o "desprezo" -, quem sente vontade de visitar Bucareste?

Bom domingo. :)

 

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