quinta-feira, abril 14, 2005

Manifesto pelos Plátanos

Escrevo este manifesto em defesa dos maltratados Plátanos, árvores que, outrora, adquiriam grande notoriedade nas nossas praças, ruas, largos e adros. Diria que já faziam parte da fisionomia de muitos espaços edificados. Em muitos casos deviam ser classificados como exemplares de interesse público, dado o seu esplendor e beleza. Porém, o homem moderno, na sua insana necessidade de destruir, implicou com a copa frondosa, bela e esteticamente aprazível destas árvores, tendo recorrido às podas (camarárias) de forma a decepá-las e torná-las esteticamente desoladoras, tristes e doentes. Procurou ainda imputar-lhes a falsa reputação de fomentarem algumas doenças alérgicas.
Felizmente, algumas acções de sensibilização mais recentes, têm disciplinado algumas destas condutas, levando a que as podas camarárias sejam mais moderadas, embora continuem a constituir uma prática estranhamente usual. Como é que uma árvore pode enriquecer um espaço urbano na sua componente paisagística, sem que a sua copa se apresente frondosa, equilibrada, redonda e sadia? As podas justificam-se em ramos secos e nos lançamentos de ramos ou pernadas que interferem com a circulação do tráfego automóvel, ou no caso de perigarem algum bem. São imprescindíveis quando se está perante algum problema fitossanitário. Apenas nestes casos.
Mas esta obsessão de intervir sobre as árvores de arruamentos, leva a que determinados zelosos vejam numa simples cavidade de uma árvore, um pretexto para abatê-la. São insensíveis e ignorantes para interpretar uma cavidade num tronco, como fazendo parte de um processo natural de decrepitude de uma árvore. Não respeitam a sua decadência natural, refugiando-se em evasivas ardilosas para cortá-las. Piores cavidades são as que povoam as suas mentes ocas. De insensibilidades inauditas. O certo é que uma cavidade, ao atingir determinada dimensão, servia de esconderijo das crianças nos jogos populares, constituía um recanto para deixar cartas secretas dos amantes, facilitava o abrigo de animais. Lamentavelmente, em muitos casos, qualquer anomalia numa árvore é usada como pretexto para abatê-la. E os pretextos são tão mesquinhos que se chega a assistir a quem, impudentemente, alegue que as árvores provocam muito lixo devido à folhagem. E não valerá a pena pronunciar-me sobre a beleza que constitui um tapete colorido de folhas ou flores que, nalgumas ocasiões, quase me senti tentado a implorar ao varredor municipal para não varrê-las. Todavia, em boa altura o bom senso conteve-me.
Pese embora as árvores terem o objectivo de melhorar a arquitectura da paisagem urbana, tornando o quotidiano de quem nela se insere, bem mais aprazível e harmonioso, melhorando a estética dos espaços urbanos, mitigando a reflectividade da luz e almofadando o ruído, ainda se assiste a uma necessidade atroz de intervir sobre elas, deixando-as inócuas na sua função decorativa e paisagística, visivelmente inestéticas. São actos absolutamente criminosos sobre as árvores.
Por fim, resta-me o esforço de tolerar alguns iluminados que, considerando os Plátanos espécies exóticas, têm sobre estas árvores, uma postura racista e xenófoba, preferindo optar facciosamente por espécies designadas de indígenas para os arruamentos. No caso da Madeira, são espécies providas de folha persistente e mantêm uma tonalidade verde todo o ano, o que as torna lúgubres, frias, dotando os espaços urbanos de verdadeira melancolia: isto sem querer prever os potenciais focos de problemas que, a nível de sanidade vegetal, estas últimas espécies podem fomentar, aliados à sua fraca resistência à poluição atmosférica, característica das cidades.
Por sua vez, os Plátanos apresentam uma casca em placas que se auto-renova continuamente, deixando a sua superfície sempre limpa e matizada de tonalidades castanhas e esverdeadas, de incontornável beleza. As folhas, que adornam o chão nos meses do Outono, pressagiam o tempo frio do Inverno. Salpicam as ruas e praças de forma graciosa e característica da época, e não são raras as vezes em que vemos as crianças a recrearem-se com as folhas caídas, tão apetecíveis ao tacto e à curiosidade das suas formas. O facto de o Plátano ser uma árvore de folha caduca, dota a folhagem de variações cromáticas belas, que se expressam pelo renascer das folhas na Primavera, garridas por uma cor verde clara, e que culminam com as tonalidades avermelhadas e cruas, que antecedem o seu total perecimento no Inverno. Como árvores de folhas caduca, têm ainda a particularidade de deixar passar o calor nos meses frios de Inverno e proteger dos raios quentes e abrasivos do Verão, criando um microclima agradável na sua envolvência, de indiscutível deleite.

7 Comments:

At 12:03 da manhã, Blogger clarinda said...

Duarte,
uma árvore é sempre a imagem da vida. Quando fica sujeita à acção do homem, domesticada nos parques,praças e ruas está absolutamente desprotegida.

Olha, escolhi-te para dares continuidade a uma cadeia de literatura na blogosfera, vai ver em Água Viva.
Um beijinho

 
At 12:49 da manhã, Blogger Ana said...

Aprecio o que escreves. Não só pela forma como o fazes, mas pelos temas que escolhes, pela defesa dos direitos daqueles que não falam... o mar... as árvores... a vida!
Pressinto que o deves fazer não só aqui. Haverá outro local onde te possa ler?
Um beijo.

 
At 1:33 da tarde, Blogger DT said...

Amigo Duarte,
Alerta pertinente, este que fazes. Esperemos que chegue aos ouvidos/olhos das pessoas certas!
Abraço

 
At 1:38 da tarde, Blogger Isabel Magalhães said...

Eu também ando sempre em dedesa de qualquer coisa - em defesa da vida, da vida dos menos lembrados.
E aproveito para lembrar que no Concelho de Oeiras os plátanos são bem tratados; retirados cuidadosamente de locais destinados a melhorias para o concelho e colocados nos inúmeros espaços novos.
Aproveito para deixar o meu manifesto pelos cães recolhidos no Canil de São Pedro de Sintra, que apoio.

www.apca.org.pt

Espero que não leves a mal! )

 
At 7:40 da tarde, Blogger Fragmentos Betty Martins said...

Olá Carlos

É uma realidade, hoje faz-se verdadeiras barbaridades. Em nome de um plano urbanístico!!! Em prol da defesa do ambiente!!! Será que eles sabem o que isto é? DUVIDO!

Estou contigo... no "Manifesto pelos Plátanos"


Um beijo

 
At 6:42 da tarde, Blogger Fragmentos Betty Martins said...

PEÇO-TE IMENSAS DESCULPAS!!! :(

Por ter trocado o nome, foi mesmo uma distração minha.

Espero que por ti seja perdoada, Duarte!

Um beijo

 
At 8:31 da tarde, Blogger Fragmentos Betty Martins said...

Olá Duarte

Agora o pedido é outro! passa pelo o meu blog,fui apanhada na "REDE" e passei também o testemunho para ti :)

Um beijo

 

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