sábado, maio 14, 2005

Passageiras Fugazes


 Posted by Hello

Há pessoas que nos tocam, que passam por nós como cometas, deixando apenas um rastro de luz que nos enleva o espírito. Há pessoas que nos beijam com letras, que no jogo das palavras, se revelam artífices, mas que espelham nas ideias, a magnanimidade da alma, assente numa sensibilidade invulgar que sobeja e nos embriaga.
Manifestam-se através de olhares que nos estremecem, em gestos cuja destreza parece devedora ao mundo onírico, em palavras redigidas com uma sensibilidade que nos causa voraz empatia.
Aparecem na nossa vida como o orvalho da manhã, condensam-se e recriam pequenas gotículas de água cristalina que resplandece à luz, e que no seu crescimento esplendoroso, vão formando uma centelha cada vez mais ténue, sedutora, que, num esgar, se desfaz na fatalidade da vertigem do mundo. Talvez nos alertem para a efemeridade das coisas terrenas, numa ilusão fugaz que destrona a possessibilidade, aviltada pelas passagens que se vão impregnando nas nossas mundividências, devolvendo-nos a verdadeira e loquaz sina da existência, integradora na harmonia do universo. Desprendemo-nos das coisas vãs do mundo, ansiando novas gotas que, inesperadamente, continuarão a surgir, tornando admirável e aliciante a descoberta e depurando a nossa alma que, paulatinamente, carrila no trilho que conduz ao arco-íris da vida. Queria ser uma gotícula na vida de outros, neste desejo de retribuir magias de momentos, partilha de fragmentos de mim. Queria solidificar-me em gotícula, mas não digo para quem. Quiçá não saberei. Elas surgem e num lampejo, desaparecem inapelavelmente, indiferentes face à nossa inércia para agarrá-las. Fica a sua acção depurativa, na qual, quanto mais gotículas puras e cristalinas caírem na minha alma, maior será a catarse da minha essência.
Sobra a sensação de vazio, certamente resultante do potencial que, de soslaio, esteve ali ao alcance das minhas mãos, mas que devolveu ao todo, a sua forma. Sentimos que passaram por nós como relampejos, sem, todavia, conseguirmos definir os seus contornos mais profundos.
São sinais. Tão fugazes como este quotidiano, não permitindo repetições ou recuos. Quando acordamos para elas, já só lhe vemos o rastro. Somos acometidos por saudades, mas elas, no oceano do mundo, continuam a sua missão peregrina, quais balões de oxigénio que nos desanuviam o respirar, que nos amaciam a alma e fazem palpitar os corações. Estremecemos de candura, ansiamos pela sua presença, enquanto resplandece o seu esplendor, e num esgar, imiscuem-se na vastidão do oceano, ficando a sensação de dor.
Distantes, idas, certamente a memória não as alcançará todas, mas o coração, seguramente, já as possui.

8 Comments:

At 3:07 da manhã, Blogger DT said...

Amigo Duarte,
Mais uma vez rediges um brilhante texto, descrevendo com as palavras exactas os teus (os nossos!) pensamentos. Não usas nem uma palavra a mais, nem uma palavra a menos.
Confesso que o gesto que me é mais característico ao ler os teus textos, é um abanar da cabeça em sinal de concordância.
Tens o dom de escrever lindamente as vicissitudes da vida.
Abraço leonino (neste tão importante dia)

 
At 9:31 da manhã, Anonymous Anónimo said...

Duarte,

Mais uma vez senti-me deliciada a ler um texto teu. Gosto da forma como te expressas acerca das pequenas grandes coisas da vida. Tens alma de poeta. Continua!

Beijinhos,

Rute G.

 
At 6:04 da tarde, Blogger Ana said...

Cada pessoa que passa por nós, deixa sempre uma marca. Algumas mesmo fugazes, são indeléveis.
Um beijo.

 
At 7:19 da tarde, Blogger Fragmentos Betty Martins said...

Duarte

O teu texto é LINDO... É verdade que todas as pessoas que vão passando pela nossa vida, vão dixando marcas nas páginas do "nosso livro" cada uma com a sua importância...

Um beijo

 
At 12:07 da tarde, Blogger Estrela do mar said...

...@migo...logo que comecei aos pouquinhos a comentar alguns blogs...senti uma enorme vontade de continuar com o meu...e assim fiz...

Um beijinho*.

 
At 10:24 da tarde, Blogger maresia said...

Há coisas que se páram junto a nós por um instante e que duram para lá da eternidade. A Vida é feita de momentos, este é o momento de estar aqui.

 
At 1:37 da tarde, Blogger Jingas said...

Todos nós somos um ponto na vida dos outros.
Alguns pontos são imperceptíveis, mas nem por isso deixam de contribuir para o resultado final.

Escreves muito bem. :)

deixei-te um desafio no meu blog.

 
At 10:16 da tarde, Anonymous Anónimo said...

Pontos de luz, arcos de união.
Pessoas que aparecem e desaparecem.
Que nos fazem sentir efémeras, pequenas.
Ébrias do nada e famintas de amor.
A vida num enlace de palavras doces e serenas.
O desfilar da palavra pela excelência do seu toque.
Um texto magnífico!

 

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