segunda-feira, setembro 03, 2007

Eduardo Prado Coelho

Habituei-me a lê-lo, fazia-o ultimamente nas suas crónicas do Público. Deleitei-me a ouvi-lo falar de literatura como ninguém, naquele seu timbre afável, sereno, fazendo discorrer uma sabedoria rara, enciclopédica, pincelada da humildade que lhe era inata. Adornava as suas intervenções com uma jovialidade e humor epidémico, naqueles seus gestos medidos por uma absoluta lisura de trato, de bem com a vida e com o próximo, num sorriso de horizonte, um olhar de alvorada. Lutava contra a doença, mas se o fazia, nem se vislumbrava qualquer sinal de dor ou inconformismo na sua face. Era um homem bom. Privei com as suas palavras, algumas visando um certo tipo de democracia insular; guardava dele uma opinião favorável, respeitável, de admiração. Queria ser assim, sereno, calmo, exteriorizando aquela inesgotável bonomia. Sou um produto que resulta de uma sociedade apressada, que muitos pensadores dizem caminhar para o abismo. Espero que qualquer atavismo com este arquétipo social se restrinja à pressa, porque tenho medo das alturas, sobretudo daquelas sem protecção.
Após a derradeira crónica de Eduardo Prado Coelho, li alguns depoimentos, alguns testemunhos evocativos ao homem. Um deles chamou-me à atenção pela dimensão do nome: Mário de Carvalho. Na sua brilhante evocação, fez referência aos tempos de estudante onde privou com Eduardo. Antes disso, as suas palavras fremiam com a emoção de escrever sobre a perda deste amigo, sobre o homem contemporâneo a si, por quem jamais supôs escrever uma memória. Aludiu a uma luz que se apagara, de uma geração de triunfo. O homem franco que fez parte da malha que aos poucos se vai deslassando, ficando esburacada das vidas que estruturam uma existência. Dá para reflectir, lembrando Eduardo Prado Coelho e a efemeridade de tudo, lembrando Mário de Carvalho pela presença que despoleta em mim, um misto de admiração e respeito pelo escritor, pelo homem, um dos nomes mais consensuais e afirmativos da literatura e língua portuguesa.

2 Comments:

At 1:43 da manhã, Blogger clarinda said...

Também me habituei as ler as crónicas de EPC.O desaparecimento de uma figura pública que admiramos dói sempre como se de família se tratasse.

Um beijinho

 
At 6:50 da tarde, Blogger tb said...

... e aqueles que por feitos valorosos se vão da lei da morte libertando...perduram na nossa memória, embora nos deixem um pouco mais pobres.
Beijinhos

 

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