segunda-feira, janeiro 07, 2008

Oceano Atlântico



Como é o Oceano Atlântico? Foi desta forma que me surpreenderam, nesta pergunta inusitada e assaz impertinente. Franzi o cenho e nem balbuciei resposta. Assim reagiria se me questionassem: Duarte, de que é feita a tua essência?
Para quem nunca viu o Oceano Atlântico, este, apesar de secundado em tamanho, perde as fronteiras ao alcance humano. Não sendo Pacífico, foi palco de investidas e incursões ousadas, de cruzadas e descobrimentos, de guerras e aventuras. Fértil em fauna, ainda abriga no seu âmago, diversidade e recursos que lhe pilham impiedosamente. Riposta com bravura, em rebelião impotente.
Exposto à mercê de ciclones, de sóis oblíquos ou perpendiculares, sujeito a insurrectas intempéries que revolvem o manto, furacões e turbulências indómitas, a verdade é que a imensidão deste oceano retém a respiração dos que para ele espraiem o olhar. Percorre matizes azuis e pardacentas, cintila na noite, refulge de dia, e embravece contra a rocha, espumejando as suas mágoas que depura num esgar de riso. Abrupto nas profundezas, cobre o seu relevo acidentado com um azul infinito que resplandece de dia, que reverbera envergonhado na noite, sob a regência de um luar mais ufano, ou uma noite de atmosfera límpida e bucólica. Dissecando a sua essência, pode apresentar-se calmo e amigo, ledo de graciosidade, mas bravio e encerrando uma revolta que lhe pincela de pontos brancos a crosta e desenha uma orla de espuma nas bordas. O basalto resiste à onda que lhe refrigera o negrume, quando as praias douradas estão distantes, e a onda em crista desmaia no remanso do areal.
Tonificante, o Atlântico devora quem lhe subestima a força, inspira quem o admira, revigora quem a ele recorre para depurar a alma e estados turbulentos de espírito, expurgados por triliões de gotículas que estraçalham o marasmo, que esquartejam a maledicência. Observo a maresia irisada na luz, sobejando da sua fúria, e as densas camadas de humidade que me refrescam, que inalo na sua beira ou inspiro na memória quando me dista a sua presença ou me ausento de mim.
À segunda pergunta, intencionalmente esquecida, esquivo-me, apenas sei que por vezes essa essência é de mar.

6 Comments:

At 4:39 da tarde, Anonymous Anónimo said...

E porque o mar é essência em mim enchem-se-me de sal os olhos e a alma ao saborearem estas linhas, num anseio redobrado de abarcar, pelo quadrado rasgado desta janela, a imensidão de ser ilhéu.

 
At 11:42 da tarde, Blogger Carla said...

Começas por uma questão que leva a outras de importância fulcral, de que tamanho somos, ou de que tamanho é o nosso mundo, são questões que importam responder.. Que seja a imensidão do mar idêntica ao crescimento que desejamos para cada um de nós.

 
At 9:48 da tarde, Blogger deep said...

A tua escrita é um bálsamo! Que saudades do mar!...

Bom fim-de-semana. :)

 
At 3:29 da tarde, Blogger Mim said...

Tenho que confessar que já àlgum tempo não vinha ao teu blog...

Mas vim hoje... (Felismente!!!)

E deparei-me mais uma vez com esta com esta pequena maravilha!!! Esta escrita fantástica, que transborda sensibilidade e beleza...

Quanto a essência... acho que todos os ilhéus têm-na uma (grande) parte no mar!!!! Faz parte de nós, da nossa essência!!!

Nunca me esquecerei, um dia, à quando da altura que estive em Braga, e inda por lá andei um ano, perguntaram-me do que mais sentia falta, e ficaram surpresos porque ao contrário do que esperavam, talvés família ou amigos, eu respondi DO MAR!!! :D

Beijinhos

 
At 4:51 da tarde, Blogger tb said...

fosses mar e eu seria onda...

 
At 12:28 da tarde, Blogger clarinda said...

Esse oceano assim é uma alma intensamente romântica, cabe dentro de um nome e derrama-se na página branca, despertando um aroma de liberdade.

Beijinhos Duarte.

 

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