terça-feira, março 20, 2007

Balão dos Sonhos



O balão representa a personificação de um sonho, sobretudo aquele acessível de construção artesanal que, pelo efeito da densidade do ar quente que no interior se concentrava, fazia-se elevar lenta e caprichosamente, enquanto a tocha alimentava a chama. Na superfície do mundo, assistia-se à cruzada da luz pelos céus, envolta naquele forro diáfano e frágil. Erguia-se no infinito, ascendendo lentamente, alumiando um caminho que tinha como fito as estrelas. O seu rumo fazia-se ao sabor dos caprichos do ar e da arbitrariedade da sua força propulsora: o vento. A elevação levava consigo o sonho feérico de uma criança, tal como aquele que tive na alvorada, de construir o balão em papel de seda, seguindo os passos que me foram ditados com zelo, pelas mãos de outro sonhador, mestre na criação, ensinamentos que, porém, não foram suficientes para fazer ascender esse desejo. Na altura assimilei a técnica de construção do balão, anotei os passos, os desenhos, os cortes e colagens das folhas, e os cuidados a ter na armação da tocha e cumprimento de distâncias para que o sonho não se consumisse numa gargalhada. O desconcerto das tentativas de semelhante feito, eram frustrantes, mas compensadas pelo inexcedível gáudio de outro casual arquitecto, aquele bem sucedido que lançava o balão nas noites estivais, fazendo-o subir, em que a sua ascensão levava o sonho, competia com o astro, enfrentava a cintilante estrela, e depois, por mimetismo, perdia-se na escuridão. Agora que esbarrei num afim, percebi o alcance do meu ensejo. Quis elevar uma chama para o céu, deixá-la iluminar uma nesga do infinito e vê-la imiscuir-se com a luminosidade das estrelas, querendo copiar o firmamento, acrescentar-me à imensidão da minha génese, e, da estância que me alberga, acenar ao infinito, no fundo, acenar à vida.