Cai a noite quieta e fria…
A mesma luz, a rotina das sombras…
Sôfrega espera do desejo
Do recolhimento das ruínas da carne
No lânguido volver dos dias
Vazio de progressos
Um tic-tac pernicioso,
Uma pertinaz marcha dos ponteiros.
Arrasto-me na escória do quotidiano
Destroçado pelos despojos do pensamento
Livre de crivos estreitos
Palpita o coração na noite…
Farol do meu corpo derreado
Que em voz se transforma
Depurativo cansaço que me solta
No cerrar do dia,
Mitigador da razão
Em linguagem de amor,
Sem pudica aversão, à emoção.
Na rua, o frio irrompe nos recantos protegidos
Aqui, sob as mantas,
Acorrem-me outros medos.
Nos lugares ermos da noite
No patamar de entradas, nos átrios abrigados
Recolhem-se inermes contra o frio
Imersos na solidão desabrigada
Longe do mundo,
Distantes da bonomia do homem.
Os sem-abrigo,
Sem um afago na noite
Sem um sequer, sinal de afecto.
Os meus medos? Que medos?
Quais inquietações?!
Solidariedade, fraternidade… onde derivam vocês?!
Nas intenções beneméritas discursivas?
A garra titânica da sobrevivência
Contorce-se lá fora.
E alienados estamos…
Na avareza do fútil.